Editorial: Entenda a “Janela de Overton” na política municipal de Teófilo Otoni

Editorial: Entenda a “Janela de Overton” na política municipal de Teófilo Otoni

Em Teófilo Otoni, analistas tentam antecipar o fenômeno político-social chamado de “Janela de Overton” para ajudar a dar um norte às eleições deste ano (2020) — foto: Reprodução

— Por David Ribeiro Jr

Se a sua atenção foi despertada para a leitura deste artigo é porque, muito provavelmente, você já sabe o que significa “Janela de Overton”. Mas, na eventualidade de alguém ter acessado este conteúdo mesmo sem conhecer o conceito, permita-me dar uma breve explicação:

Janela de Overton é a percepção mensurável, ou seja, que se pode medir, da opinião pública a respeito de um determinando assunto ou tema social. O termo, assim como ocorre com a “Lei de Newton”, o “Teorema de Pitágoras” e a “Pirâmide de Maslow”, reflete o nome do seu criador, ou do homem que conceituou a descoberta. De acordo com Overton, essa janela nada mais é do que a definição de um momento em que determinadas ações e temas são mais aceitáveis ou mais condenados pela opinião pública. A partir desse conhecimento, cabe aos agentes públicos, ou políticos, usar a janela em seu favor — ou, como também é muito comum, contra os adversários.

Um exemplo bem claro da movimentação da Janela de Overton para que a população aceitasse um determinado assunto ou tema foi a ascensão dos partidos de esquerda no Brasil. No início da década de sessenta a população brasileira foi às ruas na chamada Marcha pela Família defender a família e condenar o comunismo e suas “supostas práticas”. Naquele momento, com o clima quase que completamente contrário a tudo que estivesse relacionado ao comunismo, os políticos cujas ideias estavam mais à esquerda no espectro político não tinham quase nenhuma chance de serem eleitos, até porque a maioria absoluta da população via os comunistas como verdadeiros bichos-papões.

O que mudou?

Não foi rápida, mas a estratégia foi funcional. Os movimentos de esquerda se organizaram, assumiram o controle dos sindicatos, da maioria das cátedras nas universidades e passaram a investir pesado em colocar o maior número de simpatizantes de suas ideias nas redações dos jornais e dos principais órgãos de controle da cultura no País. Com uma base tão grande sendo formada, e as ideias esquerdistas sendo difundidas de forma subliminar — algumas vezes de forma escancarada mesmo —, foi apenas uma questão de tempo até que toda aquela imensa população que antes criticava e condenava as ideias de esquerda começasse a se identificar com essas mesmas ideias sem se dar conta de como a sua percepção vinha sendo moldada de forma diferente.

E o que isso tem a ver com Teófilo Otoni?

Simples. A Janela de Overton é uma ferramenta poderosa para manipular a opinião pública para se posicionar a favor ou contra determinado assunto, ideia, candidatura e/ou pessoa. E, acredite, aqui em Teófilo Otoni não é diferente.

Vou dar um exemplo bastante claro da Janela de Overton em nossa cidade: Nas eleições de 2016 o Dr. Ilter Volmer Martins, médico e provedor do Hospital Santa Rosália, foi crucificado — claro que metaforicamente — nas redes sociais. Na ocasião, Getúlio Neiva, prefeito de turno e candidato à reeleição, sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) e, embora tenha se mantido como cabeça de chapa, foi o seu candidato a vice, o Dr. Ilter, que precisou assumir a campanha. Os opositores usaram das ferramentas de Marketing para difundir uma ideia que tentava fazer colar no Dr. Ilter a pecha de que ele era o responsável pela situação do Hospital Santa Rosália, que estava quebrando, e, “se quebrou o hospital, quebraria a cidade também”.

Bem… é claro que o Dr. Ilter não tinha nenhuma culpa pelo que estava ocorrendo com o hospital. Quando ele assumiu a Provedoria, já pegou o bonde andando. Tudo bem que era sua responsabilidade, enquanto provedor, buscar e apontar uma solução. Mas dizer que a culpa por todos aqueles problemas era dele foi ir longe demais. Mas a ideia funcionou e criou o que os analistas políticos chamam de Janela de Overton. Nessa janela, a população, cuja percepção foi moldada pelas redes sociais, condenava seriamente ao Dr. Ilter por acreditar que ele não era uma boa opção para a prefeitura.

Que fique claro: não estou aqui afirmando que foi o vencedor, o prefeito Daniel Sucupira, o responsável por aquela janela. Até porque o enfoque de desmerecer o candidato a vice de Getúlio foi usado por várias candidaturas e vários grupos de interesse que não queriam a manutenção da equipe do ex-prefeito à frente da Prefeitura.

Outra questão importante: Pode até parecer que aquele foi o primeiro momento em que políticos de um determinado viés usaram ferramentas para atrair a Janela de Overton da política municipal para o seu lado. Mas não foi. Isso tem sido bastante comum há mais de três décadas. E você leu direito. A Janela de Overton vem sendo usada em Teófilo Otoni há mais de três décadas.

Vou listar aqui os principais exemplos aqui para que você mesmo possa recordar:

1988: O então prefeito Getúlio Neiva vinha fazendo uma administração com elevados índices de aprovação. Detalhe.: ele não foi eleito, em seu primeiro mandato, dentro do que chamamos de Janela de Overton, e sim por outras circunstâncias que não vêm ao caso aqui e agora. Mesmo não tendo sido eleito em uma dessas janelas, Getúlio, que sempre foi um marketólogo acima da média, moveu a Janela de Overton defendendo a ideia de que a sua “boa gestão” precisava ter continuidade, e que o nome certo para isso seria o do engenheiro Edson Soares. Com isso, Edson venceu Wander Lister, o Negão, que não conseguiu mover a janela em seu favor.

1992: O PMDB apresentou como seu candidato ninguém menos do que o imbatível Luiz Leal, considerado o mais revolucionário prefeito da história da cidade. Mas novamente Getúlio Neiva, que era um perito em comunicação de massa, vendeu ao público a ideia de que Luiz Leal, embora revolucionário, não havia feito nada de efetivo para a cidade, como ele, Getúlio, e Edson Soares também, “supostamente” fizeram. Com isso, Getúlio e Edson conseguiram eleger o médico Dr. Samir, estreante em eleições, mesmo contra o… como eu disse… imbatível Luiz Leal.

Antes que eu seja mal interpretado com o que estou escrevendo neste artigo, que fique claro que não estou endossando os argumentos usados para mover a Janela de Overton em todas essas eleições. Só estou aqui relembrando a história e os argumentos usados em todos esses episódios.

Adiante!

1996: Edson Soares se elege para o seu segundo mandato de prefeito fazendo duras críticas ao prefeito de turno, o Dr. Samir Sagih El Aouar — que ele mesmo, Edson, ajudou a eleger —, por atrasar o pagamento de salários dos servidores. Edson, que sempre pagou em dia, repetia isso o tempo todo para atrair para si o favor da opinião pública. Deu certo.

2000: O Brasil está se recuperando de uma das mais conturbadas crises econômicas internacionais, a Crise dos Tigres Asiáticos. Essa crise foi a grande responsável por minar a boa avaliação do Governo Fernando Henrique Cardoso. Os municípios também sofreram muito com a redução dos seus repasses. Foi nessa onda que Getúlio Neiva foi eleito, também para o seu segundo mandato, com um discurso de prefeito competente e austero, passando a imagem de ser a única pessoa capaz de colocar a cidade no rumo certo outra vez. Funcionou.

2004: A então deputada estadual Maria José se elege com um discurso que defendia a ideia de que Teófilo Otoni precisava mudar e romper com os nomes do passado, que, segundo ela, nunca conseguiram apresentar uma proposta viável de desenvolvimento econômico, e dar uma oportunidade para um nome novo inserir a cidade de fato e de direito no Século 21. O discurso não era vazio. Ao contrário, vinha acompanhado da promessa de uma universidade federal, que mudaria a realidade do Município, aqueceria o comércio, geraria vinte mil empregos… e, claro!, só viria para a cidade se Maria José fosse eleita. Será que a Janela de Overton foi movida? É clara que sim.

2008: Quatro anos depois, o Governo da prefeita Maria José não vai bem das pernas. A rejeição é altíssima. Mesmo com a universidade em funcionamento, as apostas são todas contra a prefeita… até que seja vendida à população a ideia de que a ZPE vai começar a funcionar nos próximos dias e de que todos devem levar os seus currículos porque serão dez mil empregos num primeiro momento e outros dez mil previstos para o ano seguinte. Os empregos nunca vieram. Na época o jornal O REPÓRTER NOTÍCIAS, do nosso grupo, chegou a publicar a foto-charge abaixo. Seja como for, foi o suficiente para mudar a janela em favor da reeleição da prefeita. Maria José, que semanas antes era vista como carta fora do baralho, foi reeleita com uma expressiva votação e com uma margem enorme em cima do segundo colocado.

Em 2012 o governo Maria José vivia um momento extremamente delicado. Apesar da reeleição embalada pela promessa da ZPE, os empregos prometidos nunca vieram e o governo caiu numa espécie de limbo político junto à opinião pública. Getúlio Neiva insistiu mais uma vez naquele seu mantra de bom administrador e de bom gestor público. E como a rejeição à Administração era muito alta, não foi difícil mover a Janela de Overton em seu favor.

E aí veio 2016, quando a Janela de Overton foi movida contra o prefeito Getúlio Neiva por causa do desgaste do seu vice, o Dr. Ílter, como eu expliquei lá no início deste texto.

Por que é importante esclarecer tudo isso?

Porque, embora estejamos há menos de nove meses de uma eleição, não estamos vendo nenhum discurso novo sendo apresentado para mover a Janela de Overton para um lado ou para o outro.

Talvez você que esteja me lendo agora possa argumentar que tanto na eleição de 2008 quanto na de 2016, só pra citar dois casos mais recentes, a Janela de Overton foi movida com fatos colocados para a opinião pública durante o período da campanha eleitoral. No caso da campanha de 2008, toda a mudança de posição da janela se deu num intervalo de uma semana e meia. E, sim, é verdade. Foi o que aconteceu.

Mas aí é que vem o entrave que pode estragar os planos de quem pretenda criar uma nova Janela de Overton para as eleições deste ano: o povo está mais esclarecido. Pelo menos tem mais acesso à informação e capacidade para não se deixar enganar por estratégicas comuns para manipular a opinião pública. Esse tipo de engenharia social vai se tornar cada vez mais difícil daqui para frente, a não ser que seja feita com base em estratégias elaboradas tecnicamente por profissionais extremamente competentes. Apostar em um fato assim agora é muito perigoso.

Por outro lado, as eleições deste ano serão as primeiras na esfera municipal pós-Bolsonaro e ocorridas no apogeu do novo fenômeno de polarização ideológica da esquerda contra a direita, ou vice-versa.

Como alguém que acompanhou o processo eleitoral em Teófilo Otoni desde 1988, ainda como um adolescente, acredito que uma eventual Janela de Overton nas eleições deste ano se baseará e se fundamentará muito mais nessa polarização do que em qualquer outra coisa.

Houve quem tentasse juntar pedras ao longo deste mandato para atirá-las no atual detentor do cargo, o prefeito Daniel Sucupira, quando chegasse o suposto momento certo. Mas Daniel, assim como Getúlio ao seu tempo, é um especialista em marketing, e conhece muito bem essas ferramentas e se preparou para refutar tudo o que lhe lançarem daqui para frente. A rejeição à frente do cargo é natural, até porque ninguém consegue, nem pode, agradar a todo mundo, mas duvido muito que tentar criar factoides seja algo funcional agora, como foi antes. A não ser que seja algo muito grave, e que seja divulgado de forma estratégica e com ações massificadas. Mas, como eu disse, duvido muito. Havia, por exemplo, quem apostava em detonar o prefeito com aquela situação dos ciganos (leia mais aqui). Mas Daniel ganhou a causa na Justiça. Ele está bem preparado para enfrentar esse tipo de ataque e conta com uma equipe muito competente para promover contra-ataques nas redes sociais, se preciso.

Sendo assim, insisto na minha aposta de uma disputa polarizada… escreva aí. Depois me cobre. Ainda voltarei a este tema.

E, como eu sempre digo:

Quem viver, verá!

Por David Ribeiro Jr.

David Ribeiro Jr. é editor-chefe do Portal minasreporter.com

E-mail: davidsanthar@hotmail.com



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