Por que o eleitor de Teófilo Otoni e região vota tanto em candidatos a deputado de fora da cidade?

Por que o eleitor de Teófilo Otoni e região vota tanto em candidatos a deputado de fora da cidade?

— Por David Ribeiro Jr. —
TEÓFILO OTONI

E aí vamos nós para mais um daqueles textões. É que não dá para responder a pergunta-título deste editorial em poucas palavras. O assunto é complexo. Mas vamos a ele.

Hoje quero refletir com você sobre um dos problemas que mais afligem à classe política do Nordeste Mineiro: “Por que o eleitor de Teófilo Otoni e região vota tanto em candidatos a deputado de fora da sua cidade?” Qual o problema com os nossos irmãos dos Vales?

E a resposta é: NENHUM problema.

Sério, David?!

É sério, sim. O nosso eleitor não tem culpa por votar em gente de fora.

Responsabilidade? Talvez.

Culpa? Definitivamente, não. Ao contrário, o nosso eleitor tem sido levado a agir assim. E neste texto eu vou te provar por quê.

Se alguém tem culpa dessa situação, desse processo por assim dizer, é a própria classe política que age da forma mais amadora possível em se tratando de conquistar e fidelizar o voto da nossa gente.

Vou dar alguns exemplos: No meu editorial do dia 02 de fevereiro, escrevi que “Daniel Sucupira e Héber Neiva, o Vavá, devem monopolizar as atenções políticas em 2022 em Teófilo Otoni”. No texto eu descrevi detalhadamente o porquê de poder afirmar isso. Em resumo, a nossa população não sabe sequer quem são os prováveis candidatos a deputado federal e estadual nas eleições deste ano, e olha que faltam só oito meses e meio para o pleito — menos do que o tempo de uma gravidez normal.

Diante da publicação do outro editorial, recebi alguns xingamentos — alguns até impublicáveis — pelo que escrevi. Alguns puxa-sacos de “supostos” prováveis candidatos (é… há aqui o que parece uma enorme redundância, mas apenas parece. Há uma explicação para isso. Prometo que depois explico). Os puxa-sacos me acusam de instigar o público contra os candidatos locais… como se fosse preciso instigar. O que eu disse foi que as pessoas só conhecem dois prováveis candidatos. E é verdade. Por que, então, ao invés de me xingar, esses “aspones” não divulgam o nome dos seus prováveis candidatos? Não podem divulgar porque os seus prováveis candidatos não sabem sequer se são, de fato, prováveis candidatos. …

Eu sei que parece confuso, mas é só a ponta do iceberg de toda essa confusão que resulta em um grande número de eleitores votando em candidatos de fora da cidade.

Nos últimos anos temos visto um monte de candidaturas que são apresentadas na última hora — literalmente. Um rápido retrospecto nos mostrará que em alguns pleitos houve o caso extremo de nomes que foram registrados na data-limite para participar da disputa, sem nunca ter dado uma única entrevista confirmando previamente a intenção — e olha que, naquele momento, as redes sociais não tinham o poder de penetração dos dias atuais para compensar o atraso.

A justificativa para essa demora é apresentada “como sendo o fato de que o eleitor está viciado”. Se se antecipar demais, o povão vai começar a pedir coisas e favores que encarecerá a campanha. Eu sei que parece balela, mas esse argumento é apresentado como se fosse uma resposta mais do que plausível para justificar o atraso em pôr o nome na rua. Eu ouvi isso em inúmeras reuniões das quais participei com candidatos para opinar como profissional de Comunicação & Marketing. Essa gente pensa que fazer postagens em redes sociais resolve tudo.

E, por falar em redes sociais, estamos vivendo outro impasse: Há candidatos que fazem postagens à la Martin Luther King Jr. (aquele do famoso discurso “eu tenho um sonho”), mas apenas para uma bolha que os acompanha nas redes. O discurso do Dr. Luther King foi o apogeu de uma vida dedicada a uma causa. Para alguns candidatos da terra, as suas postagens com esse tipo de conteúdo não passam de… postagens sem lastro com a vida prática que levam. Depois, quando não têm voto, esses mesmos nomes reclamam porque, mesmo supostamente tendo uma plataforma tão boa, não receberam a maioria dos votos da sua gente. E é aí que mora o perigo. Eles não entenderam que a maioria da população não os conhecia. Um ou outro cidadão mal sabia o seu nome. Apenas isso e nada mais. Falar para uma bolha é completamente diferente de falar para o grande público de verdade. E mesmo que se consiga falar para o grande público, uma coisa é falar… outra coisa bem diferente é convencer e “conquistar”.

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Antes de responder de forma mais específica à pergunta-título deste editorial, sobre o porquê de a nossa gente votar tanto em candidatos de fora, vou enumerar a seguir algumas das principais causas e problemas que fazem com que o nosso eleitor tenha dificuldades para votar nos candidatos da terra:

  1. Não estamos mais no tempo dos romances de Jorge Amado. Parece meio óbvio, mas os “nossos” candidatos parecem não saber disso: que atualmente ninguém mais é dono dos votos de um povo, como os coronéis foram em romances como Gabriela (cuja história se passa em 1925) e Tieta (anos 70 do Século 20). Estamos no Século 21. Atualmente temos, literalmente, o mundo à nossa disposição em um clique. As coisas mudaram, a cultura evoluiu. Hoje toda e qualquer pessoa é dona do seu próprio voto. Esqueça o tempo dos coronéis. Acreditar que um apoiador “x” ou “y” te dará milhares de votos nem chega a ser utópico. É só burrice mesmo; e da sua parte, candidato(a), ao acreditar nessa mentira deslavada.
  2. O povo não dá a mínima para um candidato-minhoca, ou seja: um candidato da terra. O fato de você ser daqui, de ser da terra, não faz de você mais apto(a), mais habilitado(a) ou mais merecedor(a) do voto dos seus irmãos dos Vales. É importante? É. Claro que é. É um diferencial? Sim, ser da terra ajuda muito a abrir portas e a diminuir resistências. Mas entenda que o eleitor, ao votar, não quer saber “de onde” é o candidato, e sim qual a sua bandeira e o que ele representa. O eleitor quer saber de forma prática e direta de que forma esse candidato resolverá o seu problema imediato — é por isso que, num passado não muito distante, tantas pessoas literalmente vendiam o seu voto. É claro que eu não concordo nem endosso essa prática, mas é assim que funcionava antes, e ainda hoje, só que agora com menos troca de dinheiro e mais troca de ideias. Sem bandeira crível e sem solução real de problema, só pagando (ainda) para conseguir o voto.
  3. Nós, o povo, não vemos nenhum(a) candidato(a) como iluminado(a). Quer voto? Então pare de achar que é um(a) iluminado(a) e entenda que, para conquistar voto, o foco deve ser no eleitor e não no candidato. O candidato, em matéria de Marketing Político, não pode passar, na percepção pública, de uma ferramenta em defesa dos interesses do eleitor. Os nossos candidatos têm atuado como verdadeiros semideuses em quem os pobres mortais têm o privilégio de votar. E aí o que acontece? Os pobres mortais acabam votando em gente de fora. Metaforicamente, os nossos eleitores se tornam pagãos diante dos semideuses.
  4. Falta de uma proposta clara e razoável para justificar o voto. Aqui a coisa fica ainda mais complicada e começa a responder, também, a pergunta-título do editorial. Muitos candidatos acreditam que estão apresentando uma proposta clara daquilo que pretendem fazer quando e se eleitos. O problema é que na maioria das vezes essa tal proposta salvadora só é “salvadora” de verdade para o seu círculo social. A maior parte da população nem liga para isso. Talvez a proposta até seja boa e viável de verdade, mas o candidato tem de saber explicar para as pessoas como essa sua bandeira vai salvar o mundo — e, em especial, como vai salvar a nossa região. Em linguagem banal, o candidato precisa aprender a se vender, e à sua ideia, para o eleitor.

Ninguém aguenta mais ouvir falar de algo tipo ZPE, hospital… nem mesmo universidade. Esses dois últimos são bons e importantes em todos os sentidos, mas o primeiro (hospital) parece que nunca sai do papel, e a universidade acaba por privilegiar apenas aqueles que conseguem uma nota alta o bastante (boa parte dos alunos nem é da cidade). Antes de fazer uma proposta — ou promessa — o candidato deve se certificar de que sabe comunicar a sua ideia, e de que o grande público tem interesse em interagir com essa ideia específica. Do contrário, tudo o que disser não vai passar de falácia.

Ainda nessa pegada da falta de uma proposta clara, há aqueles que se apresentam como “honestos”, “competentes”, “bem-intencionados”, “apaixonados pela região”, “conhecedores dos problemas sociais”… Gente, qual é?! Todos esses atributos não passam de obrigação da parte de alguém que se predisponha a representar um povo. Sem falar que, no imaginário popular, quando um candidato fala muito que é honesto, lembrando isso o tempo todo, acaba soando como se ele não fosse honesto de verdade, mas sim que está tentando provar que é. São coisas absolutamente diferentes. Em matéria de Marketing nós costumamos dizer que se você quer destacar alguma “virtude” sua, lembre-se: o melhor é que outra pessoa diga isso. Autoelogio soa, no imaginário popular, como mentira ou como algo no mínimo suspeito. Acaba sendo melhor não fazer. E se acha que estou exagerando, pergunte ao seu psicólogo na sua própria sessão de terapia. … Ah, você não faz terapia?… Tá explicado, então. Deveria, tá?!

Voltando a falar de coisas que não fazem sentido para o grande público, de nada adianta falar de propostas mirabolantes como aeroporto, hospital, ZPE, estrada de ferro, duplicação da rodovia “x” ou “y”… Enfim, na percepção do público todas essas coisas são meio que… um mito. É algo quase folclórico. Seria legal se existisse, mas não passa de lendas urbanas. É como o Papai Noel e o Coelhinho da Páscoa para crianças pobres. Essas crianças ouvem falar que o Papai Noel virá, que o Coelhinho da Páscoa vai deixar um ovo de chocolate… mas ano após ano o bom velhinho não vem, nem o tal coelhinho. Seria bom se viessem? Seria ótimo. Mas eles nunca vêm. Quando essa mesma criança, agora crescida, vê todo mundo comemorando essas datas, ela até finge que se empolga, principalmente quando também tem filhos, mas acha isso uma enorme bobagem, que é o mesmo que pensa do aeroporto, da ZPE, do hospital, da duplicação da rodovia, da estrada de ferro… tudo isso seria muito bom se realmente existisse, mas é só historinha que os políticos contam para angariar votos. “Nada disso vem de verdade”, pensa o nosso eleitor que, para piorar, ainda tem o exemplo da ZPE onde se gastou alguns milhões de reais para depois ver o prédio ser vendido… e pronto. Fim da história (que não teve início, meio ou final feliz).

Que fique claro: Eu defendo a necessidade de os nossos agentes políticos lutarem por tudo isso que enumerei no parágrafo anterior. Mas admito que o povo deixou de acreditar que seja possível. Se formos minimamente razoáveis, chegaremos à conclusão que, dadas as circunstâncias, até que o nosso povo ainda vota é muito nos candidatos da terra. Talvez seja porque os mais jovens ainda não formaram memórias de todas essas decepções. Já os mais velhos são mais tendentes a não acreditar mais em Papai Noel e aí ocorre o pior de todos os sintomas que tão mal nos faz politicamente, como demonstro a seguir.

Prometer quaisquer dessas coisas é perder tempo, pois já não causa mais nenhuma identificação real com o eleitor. É como chover no molhado. E como não há nada que, de fato, convença o eleitor de que o candidato-minhoca, o cara da terra, é realmente importante, já que o que ele promete o eleitor não acredita ser possível, esse mesmo eleitor acaba buscando alguém com quem se identifica de verdade. É por isso que líderes religiosos e de movimentos sociais têm tanta facilidade de sair arregimentando votos em todas as regiões do Estado. Esses líderes falam de coisas com as quais o eleitor se identifica, quer ouvir e acredita ser realmente importante e possível.

Por exemplo: quando uma autoridade religiosa diz que é preciso alguém para defender os valores morais apregoados pela sua fé, o eleitor se identifica com isso, pois pensa a mesma coisa. Há conexão. Há um alinhamento de propósito entre o indivíduo e o grupo. E como esse candidato representa um grupo que realmente é importante para o eleitor, o resultado é voto certo. O mesmo vale para líderes de movimentos e de sindicatos (políticos policiais são um bom exemplo disso). Lembra de André Janones durante a greve dos caminhoneiros?

André Janones realmente foi uma exceção. Ele aproveitou um bom momento e puxou para si a alcunha de porta-voz de um movimento, mesmo tendo pouco tempo para isso. Funcionou. Nos demais casos, dos líderes religiosos e de movimentos diversos, há ainda outro fator decisivo: Enquanto que a maioria dos candidatos-minhoca só aparecem na reta final acreditando que por serem da terra serão mais merecedores dos votos dos nossos irmãos, os candidatos que representam bandeiras têm um canal de comunicação constante com o eleitor, seja através da fé ou da conexão social e/ou profissional. Enfim, esses candidatos de movimentos, mesmo quando não têm mandato, buscam se manter próximos do eleitor. Os da terra, por medo de serem explorados com pedidos de ajuda, fogem do povo da terra. Dá no que dá.

Como não há identificação com o cidadão, o eleitor começa a ver esses candidatos locais como uma perda de tempo. “Prefiro fulano (do movimento) porque esse, sim, me representa. O candidato da terra pode até estar trabalhando bastante, mas o eleitor entende que ele não faz nada e só ganha no mole. Como esta é uma análise sobre percepção pública, estou aqui apresentando a visão da maioria dos eleitores. Eu, como profissional de comunicação que acompanha a política de perto, entendo que temos alguns bons representantes e alguns bons nomes pleiteando a posição desses representantes. Mas isso entendo eu. A grande maioria da população não vê as coisas assim, e também não é minha obrigação trabalhar para popularizar candidaturas-minhoca só porque tenho um veículo de comunicação de massa em minhas mãos.

O eleitor local entende que o candidato da terra quer ter com ele uma relação à la mulher de malandro. O problema é que até o malandro sabe que, para manter a mulher, precisa comparecer de vez em quando e fazer uns “agrados”. O candidato-minhoca foge exatamente de fazer os agrados. Aí, como ocorre com a mulher do malandro quando não recebe os agrados, ela bate a porta na cara do malandro. Depois, desacreditada, acaba abrindo-a para outro Ricardão (o candidato de fora).

Tá explicado? Ou quer que eu desenhe?

As eleições estão logo aí. Como eu sempre digo, quem viver, verá!

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Por David Ribeiro Jr.

David Ribeiro Jr. é editor-chefe do Portal minasreporter.com

E-mail: davidsanthar@hotmail.com



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