Roberto Marcos, novo presidente do Psol: “Não vou beijar capeta, nem me associar a inimigos da cidade”

Roberto Marcos, novo presidente do Psol: “Não vou beijar capeta, nem me associar a inimigos da cidade”

O comunicador ROBERTO MARCOS, radialista, professor, publicitário e escritor, foi candidato a prefeito de Teófilo Otoni em 2016 pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). Na última quarta-feira (02/08) ele foi alçado à condição de presidente da Comissão Municipal do Partido em eleição interna realizada pelos filiados. Logo após a eleição, Roberto, como sujeito antenado que é, concedeu, via redes sociais, uma longa, mas riquíssima entrevista ao minasreporter.com. Em sua fala, o novo presidente da legenda explicou um pouco dos rumos que o partido pretende adotar na cidade, sob sua direção, e fez algumas duras críticas a figurinhas carimbadas da política local, algumas das quais chamou de “intervencionistas dos endinheirados”. Apesar da proximidade do PSOL ao PT em nível nacional, Roberto Marcos fez duras críticas às gestões petistas em Teófilo Otoni, e disse, sem papas na língua, o que pensa do primeiro momento da administração do prefeito Daniel Sucupira.

A íntegra da entrevista você acompanha a seguir:

O comunicador ROBERTO MARCOS acaba de ser eleito presidente do PSOL de Teófilo Otoni (foto: Divulgação)

minasreporter.com — Você é continuamente destacado como um dos mais competentes profissionais da comunicação no Nordeste Mineiro. Contudo, optou por dedicar-se mais à política em detrimento da sua carreira. Por quê?

ROBERTO MARCOS: Além de aceitar que a vida segue, alcancei o estágio de não mais acreditar na grande maioria dos veículos de imprensa de Teófilo Otoni e região. E isso nada tem a ver com os trabalhadores do setor. Afinal, se existem bajuladores e covardes nos espaços das rádios, jornais e tevê, há também caras sérios e corretos que sofrem muito por conta daquilo em que acreditam. Portanto, o problema não é o trabalhador da imprensa, mas, sim, os donos e os gestores de veículos. A parte dessa gente que se acumplicia a político ladrão e trambiqueiro tornou-se um desestímulo a quem, feito eu, acredita no poder e na importância da informação.

minasreporter.com — A sua votação para prefeito, na eleição do ano passado, ficou aquém do que o seu grupo esperava. Como você encarou o resultado?

ROBERTO MARCOS: Com espírito crítico e inteligência de aprendiz. Se pensarmos apenas com a frieza dos números, minha votação terá sido, sim, decepcionante. Parte disso, é que devo ter sido incompetente. A outra parte disso, é que, de fato, não fizemos campanha. Tivemos um único carro de som apenas nos últimos doze dias, não tivemos candidatos a vereadores, não tivemos tempo eleitoral e nem material gráfico tivemos. Também não pude ir às ruas por uma questão de falta momentânea de saúde, e tampouco frequentei debates, já que os mesmos foram interditados. A campanha foi tão restrita que, entre serviços e material, utilizamos menos de 4 mil reais. Tanto é verdade que, até os dias atuais, ainda encontro amigos que não tiveram notícia da minha candidatura.

minasreporter.com — Mas se sabia de todas essas limitações, por que insistiu com a colocação do seu nome?

ROBERTO MARCOS: Havia a clara intenção de defender uma plataforma, levá-la às ruas. E mesmo com todos os problemas, fiz o que foi possível. Além do mais, provei que o Psol e eu não estávamos à venda como aconteceu com outras pré-candidaturas anunciadas que, ao final das contas, só queriam mesmo um peito para mamar.

minasreporter.com — Ainda na eleição do ano passado você disse que gostaria de participar de um embate com o ex-prefeito Getúlio Neiva. Acredita que a ausência do ex-prefeito, por causa da sua saúde debilitada, contribuiu para o resultado das eleições?

ROBERTO MARCOS: A ausência de Getúlio empobreceu, sim, o pleito. Mas se me permite, prefiro debater outro aspecto desta questão. É preciso refletir sobre a presença do PT e de Getúlio que sempre fez um mal histórico ao processo. Com a briguinha dos dois, o debate sobre a cidade ganhou um desenho monotemático. Ou seja, nada mais do que a ideia burramente dominante do “nós contra eles”. Assim, campanhas ocas, sem projeto, foram se sustentando nessa polarização. Isso é tão evidente que Ricardo da Emex, sem qualquer lastro político, perigou ganhar uma eleição em Teófilo Otoni pelo simples fato de vestir a camisa de um dos lados. Prova de que, por conta desse enfrentamento absurdo entre petistas e getulistas, a campanha eleitoral veio perdendo o caráter pedagógico que deveria ter, e passou a ser não mais do que um ringue onde se pretende demonstrar qual é o menos ruim.

minasreporter.com — Se tivesse sido eleito prefeito, o que estaria fazendo diferente do atual, Daniel Sucupira?

ROBERTO MARCOS, novo presidente do PSOL, quando candidato a prefeito de Teófilo Otoni em 2016 (foto: Divulgação)

ROBERTO MARCOS: Diferentemente de Daniel, não me permitiria cercar de bajuladores, e aceitaria o desafio de aprender, inclusive, com os adversários. Buscaria na contradição, nos contraexemplos e na ambivalência imaginativa daqueles que não votaram em mim, o caminho para encontrar soluções. Não é segredo para ninguém que puxa-saco só serve para produzir a velha sensação esquizofrênica de que tudo está muito bem. Sobretudo, quando não está. Atualmente, se alguém diz qualquer coisa contra o Governo, um puxa-saco mais exaltado já se descabela todo e sai atirando contra todo mundo. Daniel deveria crescer com o preço das escolhas que faz. Em lugar de contemplar puxa-saco no cerne da sua gestão, deveria, como ação política, estabelecer um controle social do seu Governo e entregá-lo nas mãos da comunidade. O prefeito não pode querer fugir à rejeição o tempo todo, preocupando-se mais com a publicidade do que com a tarefa a cumprir. O caminho de Sucupira não é fácil, porque a única “obra” que importa, neste momento, é conseguir integrar a Teófilo Otoni pobre à Teófilo Otoni das oportunidades. E isso exige sacrifícios, imaginação e, sobretudo, coragem. Se não for assim, esse será apenas um governo de obviedades. Portanto, tão raso quanto foi o de Maria José.

minasreporter.com — Mas Maria José foi reeleita…

ROBERTO MARCOS: Em outro cenário, e em um momento em que o PT parecia inatacável. Hoje, com o PT sangrando por conta da sua recorrente mania de pôr a mão no que não lhe pertence, a sociedade teria sido menos paciente com ela…

minasreporter.com — A maioria dos cidadãos comuns não tem a noção de que, numa democracia tripartite, como é o nosso caso, negociar é fundamental para assegurar a governabilidade. Porém, as pessoas não aceitam isso. Você, em seus discursos, faz parecer que, se eleito, não negociaria. Não, mesmo?

ROBERTO MARCOS: Negociar não é uma escolha. É uma contingência. A cidade precisa discutir o seu futuro estratégico, e isso não pode ser feito apenas por um lado. É necessário que todas as forças conversem. O que eu disse, e foi malversado, é que não beijaria mão dos riquinhos que se julgam donos da cidade. Não me curvaria aos interesses da financeirização de setores que precisam voltar-se para o povo, como é o caso do transporte público ou o caso da gestão da célula central que parece ter sido feita apenas para carros. Afinal, Teófilo Otoni tem que superar a vocação de ser a cidade dos rentistas e dos escroques. Portanto, desde o primeiro dia, o meu governo emitiria um claro sinal, mostrando a serviço de quem estaria. E faria isso com transparência, sem a balela de que administraria para todos. Afinal, quem anuncia que vai governar para todos, inevitavelmente mentirá para alguém.

minasreporter.com — O prefeito Daniel sucupira tem sido elogiado por manter uma postura diferente do PT tradicional da cidade. Você acredita realmente nessa diferença? Ou pensa que é apenas uma nova roupagem para um produto velho?

ROBERTO MARCOS: Mas o que é o PT tradicional? Além de uma pequena base orgânica que, no passado, foi responsável por uma razoável produção discursiva, o PT parece-me não mais do que um bando motivado. Esse partido, ao chegar ao poder, ficou reeditando experiências de cartilha, e não soube encontrar soluções para problemas localizados, porque também nunca compreendeu verdadeiramente a alma de Teófilo Otoni. Assim, não deu conta de organizar o dinamismo que vem de baixo. A roda da história ciclou e prova, hoje, que nada de transformador aconteceu quando esse partido foi elevado ao comando. Não foram as piores, preciso admitir. Mas as administrações petistas não serviram nem mesmo como uma correia de transmissão das experiências que se acumularam. Os governos do PT foram não mais do que a ampliação do movimento da quermesse; portanto, algum barulho e resultado pouco. Espero, honestamente, que, com Daniel, não seja a mesma coisa. Até porque ele não terá outra universidade federal para salvar a sua pele, como foi feito com a razoável Maria José.

minasreporter.com — Hoje você ataca governos do PT, mas durante algum tempo você foi considerado um dos maiores defensores da ex-prefeita Maria José. Quando ela assumiu a Prefeitura, sentiu-se frustrado com aquela administração?

ROBERTO MARCOS: Defendi, sim. E quero que recorra à história e verá que nem, por isso, advoguei empreguinhos ou qualquer favorecimento. Sempre acreditei em Maria José, mas não tinha como antever como seriam os governos liderados por ela. Fato é que Maria José era uma emergência, um atalho para que as nossas ideias transformadoras ganhassem forma e vez. O seu nome foi se tornando um simbolismo da ruptura que desejávamos, e com a qual nos envolvemos. Mas quando ela venceu, o colegiado de ideias que defendíamos foi sufocado pela doença que ataca aqueles que chegam ao poder. A rendição da prefeita ao corporativismo petista impediu que fosse atenuado o contraste que havia entre o discurso proposto e as necessidades gritadas nas ruas. Assim, Maria José não conseguiu fazer um governo para além do PT, patinando na ideia tosca do pragmatismo político que o partido tanto exalta.

minasreporter.com — Você já confirmou a sua intenção de disputar uma vaga na Assembleia Legislativa. Mas esta não será a primeira vez que disputa. Como obter resultados diferentes agora?

ROBERTO MARCOS: Ainda não sei. Mas seguirei ocupando a mesma banda da história, e aceitando o desafio de atuar no campo do debate. Não tomarei o atalho de fazer concessões éticas para facilitar a minha caminhada. Isso, nunca. Não vou beijar capeta, nem me associar a inimigos da cidade com o objetivo de ter recursos para acessar votos. Teófilo Otoni precisa ter noção de que entre o entendimento do existente e a imaginação do possível, tudo pode mudar. Resta-me, portanto, em nome dessa crença, ir às ruas falar com as pessoas, e convencê-las de que o risco do novo é sempre mais recomendável do que a manutenção da tragédia.

minasreporter.com — O PSOL local acaba de te eleger presidente. Por que optar por um partido considerado “polêmico”, e que defende posturas socioeconômicas que divergem de tudo aquilo que sempre marcou a sua trajetória profissional?

ROBERTO MARCOS: Há aí uma aparente contradição. Vivi e vivo do mercado. Não sou contra ele. Apenas defendo a premissa de que é preciso desenhar um modelo novo para impedir que a sua selvageria avance sobre direitos. E quanto à minha ação partidária, eu não escolhi o Psol. O Psol me escolheu. Afinal, ninguém entra no Psol apenas porque deseja entrar no Psol. O pretendido precisará ter o aval das escolhas que fez vida afora. Logo, a partir do balanço das ideias que defendeu e das posições que ocupou é que será interessante ou não ao Psol ter esse cidadão em suas fileiras.

minasreporter.com — Uma das novas teorias políticas que está se tornando cada dia mais popular defende que a corrupção que vimos em Brasília é um reflexo da corrupção do próprio povo. Muitos filósofos e sociólogos concordam com isso. O que você pensa a respeito?

ROBERTO MARCOS: Qualquer polemista mais responsável sabe que não se pode culpar a janela pela paisagem. O eleitor tem feito escolhas ruins porque, além de induzido ao erro, acredita mesmo que tudo apodreceu. Na cabeça do eleitor, a política transformou-se num pardieiro de malandragem. E a imprensa ajuda a embaçar o cérebro do contribuinte quando não diz que existe gente diferente, e que nem todos são ladrões. Assim, enquanto a pauta novelesca do “todos são iguais” distrai o eleitor, nivelando-nos por baixo, a cidade perde a motivação de discutir um futuro possível. E aí o eleitor descrente, já que tudo mundo rouba mesmo, entende que também pode ganhar algum.

minasreporter.com — Como convencer o eleitor de que o senhor é um candidato diferente, e que merece o voto do cidadão para deputado?

ROBERTO MARCOS: Não sei. Só sei que se o eleitor teofilotonense não tomar uma decisão forte, reparadora, a cidade e a região vão colapsar. O cidadão precisa entender que os velhos políticos, e que acrescentemos nesta conta Neilando, Fabinho e Ademir, são intervencionistas dos endinheirados. E é assim que eles sempre têm grana para mercantilizar a eleição, comprando prefeitos, religiosos, lideranças comunitárias e vereadores prostitutos dos três vales. Portanto, me parece que o único modo de se desestabilizar o pacto da pouca vergonha que, às vésperas da eleição, faz-se em Teófilo Otoni, é ir para as ruas falar com a população…

minasreporter.com — Agora falemos de uma das suas facetas profissionais que o senhor não abandonou por causa da política, a vocação como escritor. Quando sairá seu próximo livro, até já anunciado aqui no minasreporter.com?

ROBERTO MARCOS: O anunciado “Os Escritos de Blanca Mares”, por estar inscrito em um prêmio internacional que exige ineditismo, teve sua publicação retardada. A minha editora, todavia, prepara para lançar, agora, no segundo semestre, “Os Ovos Azuis da Serpente”. Portanto, logo logo.

minasreporter.com — Ainda vale a pena acreditar em Teófilo Otoni, em Minas e no Brasil?

ROBERTO MARCOS: Sempre digo que ou Teófilo Otoni não merece que nós nos acovardemos, ou Teófilo Otoni merece que nós não nos acovardemos. Seja como for, a causa de todos nós sempre será a mesma: ter esperança.

(Por David Ribeiro Jr.)



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